19/11/2009

E estreamos ontem DECOMPOSIÇÃO... e nem tempo houve de actualizações...

No princípio era Jean Genet e foi “Nossa Senhora das Flores” e “Diário de um ladrão”e foi toda uma procura num sentido descendente mas numa tentativa de alcançar a elevação, a ascensão, era consumir e deixar-se consumir totalmente para rebentar e desaparecer nessa demasia e isso seria um acto poético bonito, vivencialmente doloroso mas a única via de esvaziamento, que permitiria essa levitação ansiada… mas falhou… com toda a mágoa, ter-me-á faltado coragem para me deixar rebentar, para bater no fundo e apanhar o ressalto, mas sem esperar pelo ressalto, sem saber sequer se o ressalto existiria… e nesse ressalto, sem qualquer premeditação ou esperança, deixar que as asas me crescessem e aceitá-las… ter-me-á faltado a disciplina e a coragem de me deixar cair…

DECOMPOSIÇÃO é, talvez por isso e apenas, mais um manifesto mediano sobre a solidão e a impossibilidade das relações… um cerimonial do vazio ou um cerimonial de alguém que talvez tente atrozmente fugir do vazio… há um espaço circunscrito e vedado… um falso exílio (es)forçado… há uma trindade constante e flutuante… 3 corpos, 3 cadeiras, 3 corpos vazios, 3 cadeiras vazias… e toda uma cosmética para se chegar ou disfarçar (a) o vazio… é o querer a plenitude seja ela qual for… é não estar bem assim e querer transformar-se… é o transformar-se e não alcançar a satisfação… é estar lá a negritude não verdadeiramente alcançada… é estar lá a claridade mas não a alcançar… e nessa medianidade, a insatisfação… o que lá estará afinal será sobretudo ausência…

Uma liturgia funesta do amor…? uma celebração da finitude… uma recusa da finitude… um recomeço… um reinício… um início… mas será sempre assim? uma decadência acontecida, pressentida, antecedida … quantas vezes afinal poderá amar um coração? Est ce que c’est la mort où la petit mort?

Um corpo a falhar… gasto… insuficiente… mais um corpo perdido que perdeu outros… mais um corpo a decompor-se… a decompor-se porque se quer afirmar… e, no meio dos estilhaços um pairar constante na linha média com ligeiras oscilações acima e a baixo… e esta medianidade atormenta… mói… decompõe…

Deixem-me apenas SER tremendamente… desamada ou amada… ainda que sempre e sempre me verei a fugir do caminho certo para magneticamente me afundar naquilo que me é inalcançável… e perder, perder sempre, cair, cair de amor, cair por amor, falling in love… deixem-me ascender aos céus ou enterrar-me fundo… deixem-me… deixem-me tão somente ser… tão somente amar… Para quem falo afinal? para mim… que me falta a coragem de desejar o nada e nesse nada alcançar o tudo…

Helena Botto

Aveiro, 17 de Novembro de 2009

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Ficha Artística:

Conceito, direcção artística, dramaturgia, concepção plástica e videográfica, figurinos: Helena Botto

Composição musical original e sonoplastia: João Figueiredo

Captação de imagem, edição e videoplastia: Cláudio Oliveira

Desenho e operação de luz: Pedro Fonseca

Performers e co-criadores: Cláudio Oliveira, Helena Botto e João Figueiredo

Performers no vídeo: David Q, Helena Botto e Ludger Lamers

Brainstorming inicial: André de Brito Correia

Colaboração Artística: Ludger Lamers

Registo Fotográfico: Susana Neves

Costureira: Maria Adelaide

Uma produção Projecto Transparências – criação de objectos performativos – associação

Agradecimentos: António Costa Valente, António Reis, Daniel Duarte Moreira, Emanuel Pina, Jorge Fardilha, Rui Raposo (e toda a equipa técnica do Teatro Aveirense), Maria Odete Reis, O Manequim – tecidos exclusivos e um agradecimento muito especial a André de Brito Correia

Apoios: Teatro Aveirense e Instituto Português da Juventude

O Projecto Transparências é estrutura associada do Performas – Estúdio de Artes Performativas Contemporâneas

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